Cadê meu rolo de amassar pão?

Hoje vieram cortar a energia da nossa casa pela milionésima vez. Tá bom, a gente é esquecido. Esquecemos de pagar a conta há...Dois dias! É porque sem receber a conta, fica difícil de lembrar.

Os caras chegaram e decidiram que tínhamos que pagar mil e cem dólares. É isso. U$ 1,100 de conta de energia. Putz, como assim? De 300 foi pra 1.100? E os caras querendo cortar e cobrar multa e levar o deles. Cadê a medição da energia? Ninguém sabe, ninguém viu.

Saí de casa furiosa com meus cabelos amarrados em bobs e rolo de amassar pão. Avental e lenço na cabeça. Mad housewife with a baby. Nãããão. Só troquei as shorts por calça porque aqui os rapazes ficariam muito alegres de ver as pernas brancas de uma senhorinha gringa. E eu queria full attention para meu ato que viria a seguir. Expulsei os ratos infelizes de dentro de casa e mandei-os pra calçada. Não tinha calçada e ficaram na lama mesmo.

O motorista (sim, aqui tem suas vantagens e algumas delas é que nos tornamos altos, bonitos e ricos) tentando me impedir. "Fique em casa, em casa". Ele realmente acha que eu vou obedecê-lo. E vive tentando me dar ordens. Pela milionésima vez, fiz que não ouvi e saí que nem doida. Aqui, homem resolve com homem e até o empregado homem acha que pode mandar na empregadora mulher. Afinal, a mulher não tem o direito de inverter os papeis. Só tendo mais sangue de barata do que eu pra agüentar.

"Agora vão ver a maluca", saí enfurecida. "Bring me the fucking bill and bla bla bla bla...". Não entenderam, mas entenderam e saíram.

Outro dia o mesmo motorista veio me dizer que era bom mesmo eu não ir ao show do Iron Maiden. "É muita bagunça. Coisa de homem". Vontade de pegar meu rolo de amassar pão imaginário e rachar a cabeça dele de verdade.

E olhem o que o mesmíssimo senhor me respondeu quando perguntei se aos muçulmanos era permitido casar em cerimônia religiosa uma segunda vez, caso a primeira esposa ou marido ainda estivesse vivo. "Ah, sim, podemos ter várias mulheres, basta que a primeira esposa aceite a segunda". Hein? Ele provavelmente nem ouviu a parte MARIDO e sequer pensou que eu estivesse falando de divórcio. E eu, por minha parte, não mencionei a palavra divórcio porque achei que estivesse implícito.

Pra completar, fui fazer as unhas (depois de quatro meses aqui, u-hu), e a manicure me contou que não vê a filha há três anos. Três anos. A menina tem cinco. Tudo porque o pai tem a guarda da criança e decide quando as duas podem se encontrar. Hein? "Ela mora em outra cidade?", perguntei. "Por favor, me dê alguma esperança e diga que ela mora em outro país", pensei. "Não, em Jakarta mesmo". What the F...!

E olha que aqui rola uma super tolerância. Tem mulheres andando de shortinhos nas ruas e eles aceitam outras religiões. Religiões, caro leitor. Não me venha com ateísmo, ok? Nessas horas é muito difícil pensar que as pessoas são diferentes, que cada lugar tem sua cultura. Nessas horas, eu sou muito preconceituosa e tenho certeza de que esse povo é atrasado demais.

Pelo menos ainda temos energia. Vou ali ligar o ar condicionado enquanto ainda posso.