Essa é pra quem tem peito

Mostrar os peitos na rua. Constrangedor? Na Europa, muitas mulheres dispensam a parte de cima da roupa de banho. No Brasil, precisa dizer que peitos e bundas estão nos cinemas, revistas, internet, outdoor e em tantos outros lugares? Ninguém se sente afrontado a ponto de reclamar. Diante dessa realidade aparentemente tão liberal em muitos países da Europa e no Brasil, por que diabos a amamentação em público parece ser um tabu? Por que tirar para fora o seio e dar mamá ao bebê não pode, é feio e incomoda tanto?

Semana passada, circularam na internet duas notícias que me deixaram pasma e puta da vida. A primeira, sobre uma mãe que foi expulsa de um pub inglês por amamentar seu bebê. A segunda relatava a expulsão de outra mãe, brasileira, em São Paulo, num salão de exposições. Eu já sabia da fama dos europeus quanto à intolerância à amamentação em público, mas não imaginava que chegaria a tanto. Em relação ao Brasil, nunca esperava ler uma coisa dessas. Eu devia estar realmente iludida quanto à realidade brasileira no tocante a este aspecto porque me surpreendi ainda mais com os comentários dos leitores brasileiros quanto à expulsão da moça inglesa. Muitos a insultavam, argumentando que ela era uma mãe irresponsável por levar um filho pequeno a um "boteco" e outros insistiam que ela ficasse em casa. Afinal, pra que foi ter filho? 

Bem, eu não conheço a tal moça e sei apenas o que li sobre a história, portanto não posso atestar nada sobre suas condutas como mãe, apenas sobre uma. Ela estava amamentando seu filho. Amamentar é garantir mais que comida, é se esforçar para que o filho cresça e se desenvolva com saúde. Essa atitude eu apóio de olhos fechados. Se é no bar, no banheiro, na calçada... tanto melhor, essa mãe não vai nunca deixar seu bebê passar fome. Mas ela foi punida justamente por fazer o que as mães devem fazer, se puderem: amamentar os rebentos. Alguém por acaso a mandou embora do pub antes de ela amamentar o bebê?  

No caso da mãe brasileira, ela foi ao Itaú Cultural, em São Paulo, a fim de assistir a uma exposição. O filho começou a chorar e ela logo tratou de amamentá-lo. Durante a mamada, uma funcionária disse que a amamentação estava proibida no lugar. De novo, pro - i -bi - da. Engraçado que, nos dois casos, ninguém se indignou com a presença dos bebês nos locais. E assim, minha dúvida persiste. Por que afinal a indignação se deu quando as mães resolveram alimentar os filhos? Esperava-se que elas dessem mamadeira, que elas se cobrissem, que elas não existissem?

Pois o fato é que as mães existem, têm peitos, colocam-os para fora na hora de amamentar e, agora é sua vez de pasmar,  também as mães precisam de vida social. Sério. As mães também comem, dormem (tá, só de vez em quando) e jogam conversa fora. Não sabia? Uma rede de amigos, uma rede de apoio, uma saída de vez em quando são fundamentais para aliviar a tarefa mais árdua que existe na vida de uma mulher, que é, no meu ponto de vista, a de criar um filho. Mães precisam compartilhar o ser mãe e precisam falar de outros assuntos. Mas acontece que mães de filhos pequenos, em geral, não podem se dar ao luxo de deixar os pequenos aos cuidados dos outros, a não ser que não amamentem - o que já vem ocorrendo em muitos cantos da Europa - veja relatos de mães brasileiras espalhadas pelo mundo sobre amamentação. 

É claro que a pessoa deve ter em mente os costumes do lugar onde mora para não sofrer constrangimentos ou até violência. Mas aqui estamos falando de países ocidentais, laicos e democráticos,  ou não?

Sobre a mãe brasileira, achei corajosa sua reação. Ela simplesmente se recusou a sair do lugar e a parar de amamentar seu bebê. Não só isso: ela organizou um movimento coletivo na internet contra sua expulsão e o diretor do Itaú Cultural acabou pedindo desculpas públicas a ela. Ele prometeu que os funcionários serão mais bem orientados daqui para frente. Tem mais. Um mamaço coletivo está previsto para o dia 12 deste mês no mesmo lugar onde a mãe brasileira foi expulsa. Essa é pra quem tem peito.

Por fim, e não menos importante, aqui em Jacarta, num país de maioria muçulmana onde as mulheres mal mostram o rosto, pude amamentar livremente em público sem sequer uma cara feia voltada para mim. No cinema, os peitos são censurados.

Veja, na revista Crescer matéria sobre o mamaço coletivo com links para as matérias sobre as mães expulsas de onde amamentavam em público.